RESGATANDO A NOSSA DIVINA HUMANIDADE
- Rev. José Luiz Carvalho
- 30 de jun. de 2016
- 3 min de leitura
Em nossos dias há uma descrença generalizada na bondade do ser humano. Os motivos para essa descrença são inúmeros e saltam aos olhos: a corrupção endêmica nas mais altas esferas de poder do nosso país, os crimes hediondos cometidos por pessoas que parecem não demonstrar um mínimo de remorso, e até mesmo, os atos mais corriqueiros do dia-a-dia, não nos deixam esquecer disso. Esse estado de coisas nos leva a questionar se há ainda alguma esperança para esta humanidade?
Diante destes fatos, alguns cristãos se sentem tentados a fazer do escapismo uma solução para esta questão e acabam voltando os seus olhos somente para o além, para um futuro distante onde paira a promessa de um novo mundo e uma nova realidade, abrindo mão de sua vida no presente. Esta negação da vida e da sua própria humanidade leva o crente a muitas frustrações e decepções.
Todavia, quando olhamos para Jesus Cristo, seu ministério e seus ensinamentos, somos direcionados para um novo sentido daquilo que pensamos acerca do próprio ser humano. Em Jesus, redescobrimos um novo valor para a humanidade – e aqui não falo de humanidade meramente como o coletivo dos homens e mulheres que habitam este mundo, mas da própria condição de ser humano –, vislumbramos de maneira plena a essência do ser humano como um projeto divino, como expressão da própria “imagem e semelhança” de Deus (Gn 1.26-28). Diferentemente do que muitos pensam, a maldade existente no mundo não é própria do gênero humano, mas uma deturpação provocada pelo pecado. Assim, o pecado não deve ser visto como algo natural no ser humano, mas como uma realidade desumana, contra a qual devemos lutar. Na vida e obra de Jesus de Nazaré esta realidade foi demonstrada de forma tão clara e latente que transformou a existência daqueles que dela partilharam. Alguns pensadores cristãos chegam a afirmar que foi exatamente no testemunho das atitudes de Jesus no sentido da valorização da condição humana no próximo e em si mesmo que a igreja apostólica vislumbrou a sua divindade. Para eles, os discípulos viam em Jesus uma humanidade tão perfeita que imaginavam: “humano assim, só sendo Deus”. De fato, a divindade de Jesus se manifestou na vivência de sua plena humanidade pelo que ele se constituiu no ser humano por excelência, no modelo exato a ser buscado por cada um de nós, isto é, quanto mais humano, mais divino. Quando leio os evangelhos formo em minha mente as cenas e episódios ali descritos e vejo Jesus se alegrando em bodas, jantares e festas com seus amigos e, por vezes, até com gente que a sociedade de então não levava em muita conta. Entretanto, cada um desses momentos se transforma em uma ocasião especial onde o amor de Deus se manifesta e os seus interlocutores descobrem a verdadeira vida. Os noivos de Caná (Jo 2.1-11), Levi (Lc 5.27-39), Zaqueu (Lc 19.1-10) e Simão (Mc 14.3-9), se assemelham a muitos dos nossos amigos e amigas com os quais interagimos todos os dias. Na vivência da humanidade e dos relacionamentos, Jesus transformou seres humanos no passado, assim como faz ainda hoje através daqueles que redescobriram a essência divina da sua própria humanidade. Desta forma, nós somos também convocados pelo apóstolo Paulo a vivenciar esta divina humanidade expressa na vida de Jesus: “Não que eu o tenha já recebido ou tenha já obtido a perfeição; mas prossigo para conquistar aquilo para o que também fui conquistado por Cristo Jesus. Irmãos, quanto a mim, não julgo havê-lo alcançado; mas uma coisa faço: esquecendo-me das coisas que para trás ficam e avançando para as que diante de mim estão, prossigo para o alvo, para o prêmio da soberana vocação de Deus em Cristo Jesus.” (Fp 3.12-14). Busquemos, portanto, exercitar esta divina humanidade que não nega a sua existência no mundo, mas também não vive segundo os padrões do mundo e do pecado; antes, a divina humanidade se expressa no viver cotidiano, na realidade do mundo, mas caminha segundo os valores do reino de Cristo. Valorizemos a vida e os relacionamentos que construímos, de forma tal, que aqueles que convivem conosco possam ver a Deus em nossa face. Em síntese, vivamos o aqui e agora, com os olhos fitos naquele que aqui viveu, morreu e reviveu por nós e para nos dar a real direção e sentido da vida, tornando-nos, assim, cada um de nós, também modelos e agentes para a reconstrução dessa divina humanidade.
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